O futebol soviético do século XXI - parte I
Muito além da política, da exótica catedral de São Basílio e do carrancudo Kremlin, a União Soviética sempre foi uma potência esportiva, seja em âmbitos futebolísticos ou em outras formas atléticas. Em campo, foram dois ouros olímpicos, uma Eurocopa, uma Recopa e uma Copa da Uefa durante o século XX. Porém, foi notável como as nações perderam o poderio que tinham com a fragmentação da URSS. É fácil observar que a Rússia, principal herdeira de todo o legado, não é uma competidora de destaque em grande parte dos esportes olímpicos (exceções feitas ao vôlei feminino, à ginástica, à saltadora Yelena Isinbayeva e à natação, por exemplo). O que dizer então de países com ainda menos representatividade, como Azerbaijão e Armênia? Mesmo a Ucrânia, segundo país da Europa em extensão territorial, demorou mais de uma década para aparecer de forma relativamente consistente no cenário futebolístico.
É inegável que, na esfera desportiva, os ex-soviéticos perderam espaço com a ruína da antiga nação. Torna-se tentador assim pensar o que teria acontecido se o bloco comunista do Leste Europeu permanecesse firme e forte, comandado por alguém (que não seria Vladimir Putin) com pulso firme. Mas como isso poderia se refletir nos campos de Moscou, Kiev, Tbilisi, Leningr... Opa, São Petersburgo, Vladivostok, Tbilisi e Tallinn?
Antes de começarmos o filé mignon deste exercício de criatividade, é necessário que se contextualize o cenário. Afinal, não é só pegar meia dúzia de russos e ucranianos, botar umas camisas vermelhas e achar que eles formam uma seleção. Há todo um contexto por trás do ‘atual’ futebol da maior república do mundo.
Durante a era soviética, os salários dos clubes locais não passavam de US$ 300 por mês por jogador e as equipes sequer negociavam atletas para o exterior. Tanto que o goleiro Lev Yashin, o “Aranha Negra” (foto), jogou toda a carreira, entre 51 e 70, no Dínamo de Moscou. Os prêmios por conquistas européias, como carros (presumivelmente Ladas) e apartamentos, eram pagos pelo governo. As eventuais glórias, lógico, eram tidas como verdadeiras propagandas do governo.
Com o fim do regime soviético, os clubes que antes eram dominados pelo governo tornaram-se patrimônio de empresários bilionários, em geral do setor energético. O CSKA, por exemplo, era o clube do exército e o Dínamo de Moscou era controlado pela KGB. Com isso, os clubes ganharam grandes – e suspeitos – investimentos, trazendo jogadores da Europa, da África e da América do Sul. Recentemente, o Zenit St. Petersburg contratou o técnico holandês Dick Advocaat, que comandou a Coréia do Sul no Mundial da Alemanha. Exemplos como este transformaram a Rússia em uma Espanha em menor escala. Ou seja: os times investem para trazer grandes nomes de fora, mas não investem na base de seus "meninos", o que enfraquece o poderio da seleção local no futebol.
Hoje, os clubes russos e ucranianos recebem grandes quantias em dinheiro, o que tem se convertido em avanço para fora dos âmbitos locais, como o título da Copa da Uefa conquistado pelo CSKA sobre o Sporting Lisboa na temporada 2004-2005 (foto). O time era patrocinado pela petrolífera Sibneft, comandada por Roman Abramovich (mandatário do Chelsea), mas trocou a marca na camisa por um banco local. O Dínamo tenta não ficar atrás e recebe US$150 milhões por ano de seu dono, Alexei Fedorychev.
O futebol russo hoje movimenta entre US$ 1 bilhão e US$ 2 bilhões por ano.
De olho em tamanha invasão de estrangeiros, o Ministro dos Esportes da Rússia Vyacheslav Fetisov decretou que os times podem entrar com até cinco jogadores estrangeiros em campo. Segundo ele, os clubes gastam até US$250 milhões por ano, o que poderia ser investido - e como - no futebol local.
Explicado como é hoje, vamos imaginar como seria. Imaginem que o sonho de Stalin não ruiu e que Rússia, Ucrânia, Bielorrússia, Geórgia, Uzbequistão, Casaquistão, Azerbaijão, Moldávia, Quirguistão, Tadjiquistão, Armênia, Turcomenistão, Letônia, Estônia e Lituânia formassem uma única nação. Como seria isto na esfera esportiva, especificamente futebolística, nos níveis de clubes e seleção?
Algumas coisas são previsíveis. Fora Rússia, Ucrânia, Bielorrússia, Geórgia e, mais de longe, Estônia, Letônia e Lituânia, as demais regiões teriam pouca representatividade esportiva. Por mais que se queria, o goleiro estoniano Mart Poom, do Arsenal, não seria titular da USSR e o Pyunik, atual líder do Campeonato Armênio (haja coração!) dificilmente estaria na primeira divisão soviética. Imagine o Uliss Yerevan então, que é o lanterna.
Sem dúvida, o futebol soviético seria dominado por equipes russas e ucranianas. Um ou outro clube da Geórgia, como o Dínamo Tbilisi, figuraria na Sovetskikh Vysshaja Liga, ou a Primeira Divisão Soviética, também conhecida como Klass A.
A manutenção da USSR manteria, evidentemente, as políticas internas. Logo, os investimentos milionários em clubes diminuiriam, o que não permitiria a ascensão de clubes emergentes, como é o caso do Shakhtar Donetsk. Em resumo: é bem provável que as mesmas equipes tradicionais estivessem na Vysshaja Liga, como seriam os casos de Dínamo de Kiev (maior campeão nacional, com 13 títulos até o fim da URSS), Spartak Moscou (logo atrás, com 12), Torpedo Moscou e Dnepr Dnepropetrovsk.
É inegável que, na esfera desportiva, os ex-soviéticos perderam espaço com a ruína da antiga nação. Torna-se tentador assim pensar o que teria acontecido se o bloco comunista do Leste Europeu permanecesse firme e forte, comandado por alguém (que não seria Vladimir Putin) com pulso firme. Mas como isso poderia se refletir nos campos de Moscou, Kiev, Tbilisi, Leningr... Opa, São Petersburgo, Vladivostok, Tbilisi e Tallinn?
Antes de começarmos o filé mignon deste exercício de criatividade, é necessário que se contextualize o cenário. Afinal, não é só pegar meia dúzia de russos e ucranianos, botar umas camisas vermelhas e achar que eles formam uma seleção. Há todo um contexto por trás do ‘atual’ futebol da maior república do mundo.
Durante a era soviética, os salários dos clubes locais não passavam de US$ 300 por mês por jogador e as equipes sequer negociavam atletas para o exterior. Tanto que o goleiro Lev Yashin, o “Aranha Negra” (foto), jogou toda a carreira, entre 51 e 70, no Dínamo de Moscou. Os prêmios por conquistas européias, como carros (presumivelmente Ladas) e apartamentos, eram pagos pelo governo. As eventuais glórias, lógico, eram tidas como verdadeiras propagandas do governo.
Com o fim do regime soviético, os clubes que antes eram dominados pelo governo tornaram-se patrimônio de empresários bilionários, em geral do setor energético. O CSKA, por exemplo, era o clube do exército e o Dínamo de Moscou era controlado pela KGB. Com isso, os clubes ganharam grandes – e suspeitos – investimentos, trazendo jogadores da Europa, da África e da América do Sul. Recentemente, o Zenit St. Petersburg contratou o técnico holandês Dick Advocaat, que comandou a Coréia do Sul no Mundial da Alemanha. Exemplos como este transformaram a Rússia em uma Espanha em menor escala. Ou seja: os times investem para trazer grandes nomes de fora, mas não investem na base de seus "meninos", o que enfraquece o poderio da seleção local no futebol.
Hoje, os clubes russos e ucranianos recebem grandes quantias em dinheiro, o que tem se convertido em avanço para fora dos âmbitos locais, como o título da Copa da Uefa conquistado pelo CSKA sobre o Sporting Lisboa na temporada 2004-2005 (foto). O time era patrocinado pela petrolífera Sibneft, comandada por Roman Abramovich (mandatário do Chelsea), mas trocou a marca na camisa por um banco local. O Dínamo tenta não ficar atrás e recebe US$150 milhões por ano de seu dono, Alexei Fedorychev.
O futebol russo hoje movimenta entre US$ 1 bilhão e US$ 2 bilhões por ano.
De olho em tamanha invasão de estrangeiros, o Ministro dos Esportes da Rússia Vyacheslav Fetisov decretou que os times podem entrar com até cinco jogadores estrangeiros em campo. Segundo ele, os clubes gastam até US$250 milhões por ano, o que poderia ser investido - e como - no futebol local.
Explicado como é hoje, vamos imaginar como seria. Imaginem que o sonho de Stalin não ruiu e que Rússia, Ucrânia, Bielorrússia, Geórgia, Uzbequistão, Casaquistão, Azerbaijão, Moldávia, Quirguistão, Tadjiquistão, Armênia, Turcomenistão, Letônia, Estônia e Lituânia formassem uma única nação. Como seria isto na esfera esportiva, especificamente futebolística, nos níveis de clubes e seleção?
Algumas coisas são previsíveis. Fora Rússia, Ucrânia, Bielorrússia, Geórgia e, mais de longe, Estônia, Letônia e Lituânia, as demais regiões teriam pouca representatividade esportiva. Por mais que se queria, o goleiro estoniano Mart Poom, do Arsenal, não seria titular da USSR e o Pyunik, atual líder do Campeonato Armênio (haja coração!) dificilmente estaria na primeira divisão soviética. Imagine o Uliss Yerevan então, que é o lanterna.
Sem dúvida, o futebol soviético seria dominado por equipes russas e ucranianas. Um ou outro clube da Geórgia, como o Dínamo Tbilisi, figuraria na Sovetskikh Vysshaja Liga, ou a Primeira Divisão Soviética, também conhecida como Klass A.
A manutenção da USSR manteria, evidentemente, as políticas internas. Logo, os investimentos milionários em clubes diminuiriam, o que não permitiria a ascensão de clubes emergentes, como é o caso do Shakhtar Donetsk. Em resumo: é bem provável que as mesmas equipes tradicionais estivessem na Vysshaja Liga, como seriam os casos de Dínamo de Kiev (maior campeão nacional, com 13 títulos até o fim da URSS), Spartak Moscou (logo atrás, com 12), Torpedo Moscou e Dnepr Dnepropetrovsk.